Souza, G. F. J.* *Médico Psiquiatra Preceptor da Residência de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da UFMG UNITERMOS: Tipicidade e Atipicidade psicóticas Estados Psicóides Espectro Psicótico Desdiferenciação simbólico-afetiva Reificação Filtro caracterológico Psicopatologia Fenomenologia RESUMO: O Autor, através da exposição de dois casos clínicos, estabelece aquilo que denomina tipicidade e atipicidade psicóticas e compara os quadros psicóticos incaracterísticos com aqueles mais típicos, em especial a esquizofrenia. Partindo dessa comparação, desenvolve um modelo teórico que culmina em uma representação diagramática das diversas unidades nosológicas pertencentes ao âmbito das psicoses endógenas , situando-as no interior de um spectrum próprio de acordo com o critério de maior ou menor tipicidade apresentada. O A. acredita que essas considera ções teóricas poderão enriquecer o instrumental semiológico psiquiátrico e, dessa maneira, tornarem-se úteis para que o médico se situe com maior precisão e segurança diante de quadros psicóticos atípicos no que diz respeito ao diagnóstico e tratamento. INTRODUÇÃO: A prática clínica do dia a dia no manejo das manifestações psicóticas em geral oferece-nos numerosos exemplos de quadros psiquiátricos fenomenologicamente incaracterísticos e, até certo ponto, nosologicamente intrigantes. O raciocínio clínico de qualquer psiquiatra diante desses casos, naturalmente, volta-se, de início, para aqueles quadros clássicos psicóticos com conteúdo psicopatológico bem estabelecido e delineado, ou seja, típicos, procurando alguma semelhança fenomenológica com eles, desde que se constituem em modelos de referência clínica obrigatórios e inevitáveis. Entretanto, muitas vezes, os enfermos relatam vivências anômalas tão surpreendentes e apresentam evolução clínica tão inesperada e imprevista, que o médico não é capaz de reconhecer, pelo menos inicialmente, a verdadeira natureza nosológica desses quadros, limitando-se a tratar o seu teor sintomatológico, prejudicando em muito o controle efetivo da doença e protelando a ressocialização dos pacientes. Desse modo, creio que se faz necessário o estabelecimento de novos referenciais teórico-práticos capazes de esclarecer e elucidar certas configurações psicopatológicas que, apesar de atípicas, estejam bem descritas e consolidadas fenomenologicamente. Para cumprir essa finalidade, neste trabalho, iniciaremos nosso propósito com a apresentação de dois casos clínicos de psicose atípica e, posteriormente, empreenderemos uma discussão teórica a respeito deles, culminando em uma interpretação dimensional dos transtornos psicóticos em geral. RELATO DE CASOS: Primeiro Caso Clínico (1 ): W. , 17 anos, sexo feminino, solteira, estudante (escolaridade: 1º grau não concluído) Residia em companhia da irmã mais velha em Belo Horizonte. Os pais haviam se separado há três anos. Os familiares entraram em contato comigo em junho de 1989 solicitando atendimento de urgência. Segundo a irmã, há uma semana, a paciente começou a apresentar mudança em seu comportamento. Apareceu, em determinada manhã, trajada com um vestido de baile, dizendo que se havia vestido daquela maneira para receber seu pai que, segundo ela, chegaria a qualquer momento (o que não era verídico). Além disso, exibia atitudes bastante infantis, medos infundados, insônia, inquietude e agitação, sendo contida com muito esforço. Ao exame, apresentava uma espécie de puerilidade travessa, entrando no consultório saltitando e pulando, cumprimentando-me com uma curiosa inflexão infantil na voz. Não conseguia permanecer sentada por mais de alguns segundos, denotava desatenção e inquietude, a expressão facial comunicava angústia, apreensão, desconforto, medo e mexia incontrolavelmente os pés e as mãos como uma verdadeira criança. Disse estar com muita saudade do "papá" e, ainda, com muito medo porque estava presenciando "visões de caras feias como monstros" (sic). Não havia evidências, ao exame, de atividade delirante ou alucinatória, a atenção era hipervigil e hipotenaz numa espécie de distraibilidade desassossegada e o pensamento, memória, consciência e consciência do eu monstravam-se aparentemente íntegros. Antecedentes Pessoais (A. P.): uso irregular de maconha; ausência de passado comicial e de outras doenças significativas; escolaridade prejudicada por várias repetências; vida amorosa tumultuada e inconstante. Antecedentes Familiares (A. F.): mãe portadora de transtorno depressivo recorrente (transt. monopolar crônico); um dos irmãos e tia materna com provável quadro psicótico. Conduta terapêutica: Prescrevi propericiazina na dosagem de 40 a 60 mg/dia mas, passadas quarenta e oito horas, como a paciente em nada melhorasse, indiquei hospitalização imediata. Durante esse período, que correspondeu a quinze dias, usou 25 mg de enantato de flufenazina associado a 15 mg de haloperidol/dia e a 200 mg de clorpromazina/dia, havendo remissão completa do quadro agudo. Em maio de 1990 voltou ao consultório acompanhada dos familiares, com sintomas sugerindo pródromo de outra crise semelhante à anterior. Havia abandonado os medicamentos prescritos e, há cinco dias, voltava a apresentar inquietação, insônia, além de medos vagos e imprecisos. Prescrevi palmitato de pipotiazina (1 ampola de 25 mg IM) associado a 40 mg/dia de propericiazina e, após uma semana, sua irmã comunicou-me que ela havia melhorado bastante. Não tive mais notícias dessa paciente até 03/12/91, quando voltou ao consultório apresentando perda da capacidade de locomoção, além de mostrar-se bastante assustada, temerosa e insone. Prescrevi palmitato de pipotiazina (50 mg IM), retornando depois de uma semana para controle. Estava adequada, síntone, locomovendo-se normalmente, porém exibia choro fácil e labilidade afetiva. Acrescentei amitriptilina (75 mg/dia) e, após alguns dias, relatou melhora acentuada. Depois desse episódio a paciente não mais retornou para tratamento e dela não tive mais notícias até que, recentemente, quase nove anos depois, tomei conhecimento que se casara, tivera dois filhos e sofrera outras crises, aparentemente depressivas, acompanhadas de inquietação e agravadas pelo uso contínuo de maconha. Impressão Geral: Presença de certos traços da personalidade, através do estudo de sua vida pregressa, compatíveis com Transtorno da Personalidade Borderline e Transtorno da Personalidade Histriônica, de acordo com o DSM-IV (2). Hipótese Diagnóstica (H. D.): Quadro psicótico atípico em paciente com transtorno da personalidade. Segundo Caso Clínico (3 ): V., sexo feminino, 32 anos, solteira, professora formada por curso superior de História. Apresentava, em novembro de 1989, quadro depressivo com episódios muito freqüentes de despersonalização e desrealização, além de crises de explosividade e agressividade dirigidas aos familiares. Estes relataram que a paciente ficava a maior parte do tempo trancada em seu quarto e,quando de lá saía, passava a insultar e ameaçar a todos, principalmente seu cunhado que nunca lhe fizera nenhum mal. Apresentava, alternado com as explosões de cólera, um choro contínuo e convulso e, por vezes, denotava um semblante transtornado com a expressão do olhar brilhantemente fixa, recusando-se a conversar com quem quer que fosse. Nessas ocasiões, ao mesmo tempo em que se sentia distanciada do mundo exterior, era presa de forte angústia e ansiedade e, então, alguns acontecimentos desagradáveis de seu passado biográfico, a maioria deles desprovidos de importância decisiva em sua vida, passavam a ocupar o seu psiquismo de forma obsessiva, repetitiva e persistente, induzindo grande sofrimento íntimo. Por mais que se esforçasse, não conseguia deixar de pensar neles e, pouco a pouco, ia experimentando um ódio inusitado dirigido a algumas pessoas da família, além de fantasias e impulsos altamente agressivos e destrutivos que, ocasionalmente, culminavam em ruidosas explosões de cólera e rompantes impetuosos que surpreendiam a todos. Ao primeiro exame de V. e subseqüentes entrevistas, não detectei atividade delirante e/ou alucinatória, a consciência era clara, a linguagem caracterizava-se por rica fluência verbal, o pensamento e demais funções psíquicas mostravam-se aparentemente normais. Tive a impressão de tratar-se de pessoa muito tímida e contida, mas notei uma singular frieza afetiva envolvendo os seus relatos, inclusive aqueles que, forçosamente, deveriam induzir mobilização emocional importante. Isto era, de certo modo, acentuado por uma leve afetação que coloria o seu modo de falar e a sua espontaneidade gestual era ligeiramente embotada por uma vaga conotação mecânica. Essa impressão de falta de naturalidade era reforçada pela expressão do olhar e pela mímica, ambos pouco expressivos. No entanto, não detectei incoerência ou discordância significativa na sintonia afetiva, pairando, no contato verbal, apenas uma leve sensação de estranheza. Antecedentes Pessoais (A. P.): Vários tratamentos psiquiátricos desde a adolescência, inclusive ECT sob narcose e curarização aos dezessete anos em caráter ambulatorial. Parto normal a termo, DCI sem complicações, ausência de passado comicial ou outras doenças significativas; temperamento contemplativo e introvertido; timidez excessiva na infância e adolescência; vida amorosa escassa. Provavelmente, distímica desde a infância. Antecedentes Familiares (A. F.): Vários casos de transtorno psiquiátrico na família, provavelmente compatíveis com depressão maior, distimia e transtornos de personalidade; pai tem o diagnóstico de "esquizofrenia", mas, aparentemente, não evidencia prejuízo visível em sua vida social e familiar. Conduta Terapêutica: No início do tratamento prescrevi imipramina (50 mg/dia) que não tolerou devido ao agravamento da ansiedade e da inquietação. Como segunda tentativa, usou maprotilina na dosagem de 75 mg/dia com muitos poucos resultados favoráveis. No auge das crises, prescrevi palmitato de pipotiazina (1 ampola IM de 25 mg quinzenalmente) com resultados clínicos surpreendentemente positivos a partir do terceiro dia após a primeira administração do medicamento. Trinta dias depois, substituí a maprotilina por clorimipramina (50 mg/dia) e, a partir de então, o quadro clínico evoluiu muito bem, mostrando-se tranqüila, cooperativa e com desaparecimento das crises e de suas vivências anômalas, inclusive dos episódiso de despersonalização e de estranheza do percebido. Dessa maneira, V.. encontra-se atualmente compensada, usando, há cerca de cinco anos, somente paroxetina na dosagem de 40 mg/dia. Impressão Geral: Presença de certos traços da personalidade, através do estudo de sua vida pregressa, compatíveis com Transtorno da Personalidade Borderline e Transtorno Esquizóide da Personalidade, além de distimia, segundo o DSM-IV (2). Hipótese Diagnóstica (H. D.): Quadro psicótico atípico em paciente com transtorno da personalidade. DISCUSSÃO CLÍNICA E CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS: A primeira crise aguda de W. evidenciava um aspecto clinicamente maniforme sem que, no entanto, se pudesse caracterizá-la perfeitamente dentro dos moldes de uma fase maníaca típica. Por outro lado, era visível uma nítida tonalidade depressiva entremeando seu comportamento hipercinético puerilizado e a análise mais detalhada de suas vivências anômalas revelava, além de um claro taquipsiquismo, sentimentos de teor melancólico, tais como apreensão, angústia e temor. Já a sua segunda crise aguda, exatamente um ano depois, continha caráter francamente depressivo mas, de forma semelhante, não se enquadrava no interior dos critérios diagnósticos para a caracterização de uma fase depressiva típica. Pode-se afirmar que seus sintomas agudos consistiam em modalidades de vivências subjetivas anômalas constituídas por elementos depressivos e maníacos de irrupção simultânea, porém dotados de caráter frustro e malogrado(4), ocasionando, dessa forma, o seu aspecto atípico e incaracterístico. Isso foi confirmado pela resposta terapêutica favorável à administração de um neuroléptico incisivo e, posteriormente, à associação de um anti-depressivo. A evolução clínica temporal de W.. ocorreu de forma relativamente benigna e favorável. No entanto, alguns aspectos psicopatológicos de seu quadro clínico necessitam ser melhor elucidadas e creio que o serão de modo mais claro caso deixemos para fazê-lo após a discussão do caso da paciente V. e das considerações teóricas que virão depois. V. apresentava tendência à introversão, a procurar refúgio dentro de si mesma, em sua imaginação, devaneios e fantasias, além de revelar, desde sua infância, uma clara predisposição ao comportamento solitário. Segundo seu próprio relato, tinha sido uma criança excessivamente tímida, arredia e medrosa. Lembrava-se que, durante a infância, quase não participara da maior parte dos folguedos e brincadeiras das crianças de sua idade, tinha medo demasiado de tudo e era sujeita a crises frequentes de terror noturno e abalos nervosos. Referia que fora menina extremamente sensível e impressionável, na maior parte do tempo preferindo brincar sozinha, mergulhada em um universo ricamente povoado de estranhos seres e companheiros imaginários. Ao ingressar na puberdade, passou a sofrer intensas crises depressivas e começou, então, a submeter-se a tratamentos psiquiátricos dos quais necessitaria por toda sua vida. Ao lado dessas nítidas vulnerabilidades de personalidade, em contrapartida, sempre tivera uma vida intelectual muito rica e interesses culturais bastante aprimorados. Desde cedo, interessara-se vivamente por Arte, demonstrando talento especial pelo desenho, além de nutrir uma singular curiosidade por Ciências Humanas e Filosofia, o que se ajustava muito bem ao seu temperamento contemplativo e estético. Como era de se esperar, tinha vida interior muito densa, voltada, naturalmente, para a reflexão, mas, ao mesmo tempo, era atormentada por inúmeros conflitos, dúvidas, inseguranças e hesitações. Sua vida social sempre fora difícil e problemática, desde sua adaptação aos grupos de colegas de escola e até no que diz respeito a relacionamentos íntimos e amorosos. Era pessoa assaz desconfiada, arredia e extremamente suscetível aos menores e mais leves sinais de desaprovação e rejeição. Por outro lado, possuía temperamento afetuoso e altruísta, valorizava e cumpria com correção e seriedade suas responsabilidades e compromissos, preocupando-se demasiadamente com os problemas de seus familiares. Sua vida profissional era muito comprometida devido aos frequentes atritos com os colegas de trabalho nos vários empregos que teve e, desde uma crise nervosa grave que sofreu no exterior quando fazia pós graduação, limitou-se a fazer planos e projetos que nunca foram concretizados. No entanto, quando advinham as crises, tornava-se estranhamente colérica, explosiva e irascível, isolando-se de todos e manifestando um sentimento de ódio aparentemente despropositado. Ultimamente vinha experimentando, por longos períodos, alguns sentimentos e estados de ânimo marcados por apatia e impassibilidade e, às vezes, uma indiferença fria e indolente. Em outras ocasiões, quando se avizinhavam as crises agudas, vivenciava uma tendência à irritabilidade, à exaltação e ao nervosismo acompanhada de emoções fortes e mobilizadoras vinculadas a imagens vívidas de seu passado infantil e juvenil. Parece provável, depois dos relatos desses dois casos clínicos, que ambos correspondem a quadros psicóticos atípicos em pacientes com transtornos da personalidade. Tais quadros atípicos que, em nossa opinião, seriam melhor conceituados caso fossem denominados estados psicóides (4), parecem consistir em expressões psicopatológicas diversificadas correspondentes a sintomas frustros e abortados de quadros psicóticos bem definidos e típicos. Os termos típico e atípico, por sua vez, remetem à formulação daquilo que pretendemos conceituar, ou seja, tipicidade e atipicidade psicótica máxima. Entendemos como tipicidade psicótica máxima aquele padrão de expressão psicopatológica onde estão incluídos, em um corte transversal do registro fenomenológico, todos os sintomas característicos da esquizofrenia, sejam eles predominantemente positivos ou negativos (5) e, também, em um corte longitudinal, a sua costumeira e conhecida evolução clínica desfavorável que leva, invariavelmente, a uma condição de deterioração psíquica ou defeito processual (6,7)após a sucessiva eclosão de brotos psicóticos. Em suma, o grau máximo de tipicidade psicótica abrange, além do aspecto psicopatológico morfologicamente característico e inconfundível dos brotos ou surtos esquizofrênicos em sua eclosão aguda e produtiva, o progressivo e fatal comprometimento da dimensão simbólico-afetiva (8) do enfermo durante a evolução clínica da doença. Assim, situam-se no pólo de tipicidade psicótica máxima aquelas vivências anômalas que os autores clássicos tão bem descreveram e agruparam, tais como eco, roubo e publicação do pensamento, fenômenos de influência e alucinações auditivas sob a forma de vozes dialogantes, dentre outras (6,9,10). Entretanto, estes sintomas psicopatológicos específicos somente deverão pertencer ao pólo máximo de tipicidade psicótica caso coexistam com uma evolução clínica desfavorável, característica da esquizofrenia. Pode-se notar que mencionei o termo "dimensão simbólico-afetiva" e isto remete a um conceito empírico-clínico que já estabelecemos anteriormente e que pode ser útil na prática, isto é, a noção de desdiferenciação simbólico-afetiva (8). Ao nosso ver, essa alteração parece ser a característica axial do transtorno esquizofrênico e ocasiona a emergência de algumas modalidades de simbolização filogeneticamente arcaicas (8) que saturam os processos de integração psíquica superiores de um indelével caráter de reificação. Entendemos como reificação, aquelas modalidades arcaicas de natureza mágico-anímica, ou seja, de simbolismo concreto que colorem e enformam os juízos delirantes e vivências alucinatórias tão comuns nos esquizofrênicos. É interessante ressaltar que à medida que essa doença progride, notamos uma espécie de apagamento dos sulcos caracterológicos individuais, a perda progressiva daquelas matizes e peculiaridades de temperamento e de caráter, tão particularmente pessoais em todos nós e que imprimem a marca da própria singularidade humana. O termo kraepeliniano demência precoce sugere tal fenômeno de esvaziamento da personalidade, de perda das peculiaridades pessoais aliada a um déficit cognitivo sempre presente, sendo o enfermo lançado em um tipo de universalidade vazia e arcaica, privado que foi, definitivamente, do universo da diversidade simbólica, daquela plasticidade que envolve as mais leves, finas e sutis diferenças pessoais. Ocorre-me, à guisa de comparação, a imagem metafórica de uma árvore robusta e frondosa com uma viçosa e verdejante copa ornamentada por inumeráveis e coloridos frutos e flores que, lentamente, fosse sendo destruída em um sentido vertical ou descendente. Inicialmente, ficaria privada de seus frutos e flores, as folhas se tornariam foscas e sem vida, até se reduzir a um tronco ressequido e tosco. Parece que o processo esquizofrênico também ataca a vida psíquica em um sendido vertical e descendente. Vão se esvaindo, de maneira gradual, aqueles atributos pessoais mais refinados e singulares, até ocorrer o que a escola alemã de psiquiatria chamava de embrutecimento (verblödung) (6) para denominar o aspecto cognitivo-afetivo deficitário dos pacientes dementes precoces. Provavelmente, com o comprometimento irreversível das modalidades superiores de integração simbólica e afetiva resultante de processo de desdiferenciação destes setores, emergem expressões mais arcaicas de simbolização que ocupam, de maneira anárquica e definitiva, a totalidade da vida psíquica. Pois bem, estamos considerando o protótipo clínico da tipicidade psicótica máxima, isto é, a esquizofrenia. E quanto aos quadros psicóticos atípicos que estamos denominando estados psicóides, ilustrados pelos dois casos clínicos anteriores? Creio que é razoável supor, retornando ao início da discussão teórica, que tais quadros clínicos atípicos representem a evolução incompleta e malograda de nosologia correspondente a um transtorno de humor típico, seja depressão ou mania, ou mesmo, talvez, a um transtorno potencialmente esquizomorfo A morfologia clínico-psicopatológica desses quadros corresponderia, assim, a vivências anômalas abortadas oriundas de sintomas schneiderianos (9,11) ou afetivos típicos ou, ainda, de ambos coexistindo simultaneamente. Dessa maneira, considerando-se que essa expressão psicopatológica prevalente corresponde a sintomas frustros e abortados de quadros psicóticos bem definidos, é de se esperar que sua evolução clínica seja também frustra e incaracterística, ocasionando um decurso clínico favorável e benigno. Observamos, também, que grande parte dos quadros psicóticos atípicos desenvolvem-se sobre uma personalidade pré-mórbida alterada e que a diferenciação entre as reações vivenciais anormais constantes e duradouras desses pacientes e aquelas características formais dos estados psicóides que neles se apresentam, eventualmente, pode ser fenomenologicamente detectada (4). Em primeiro lugar, as reações vivenciais anormais dos pacientes com transtorno da personalidade, tais como "instabilidade afetiva", "raiva inadequada e intensa", "mudanças acentuadas do humor básico e depressão, irritabilidade... raiva inadequada e intensa... sentimentos crônicos de vazio e enfado..." agrupadas no DSM-III-R (12) como critérios diagnósticos, equivalem a experiências subjetivas marcadas por moderado ou intenso sofrimento íntimo e se manifestam de modo costumeiro e habitual, enquanto nos estados psicóides notamos uma ligeira ruptura do encadeamento existencial do indivíduo ao lado de sintomas agudos atípicos, sejam predominantemente esquizomorfos ou afetivos. Além disso, de maneira geral, o registro fenomenológico dessa ruptura existencial desperta no observador um sentimento de estranheza diante daquilo que lhe soa incompreensivelmente incoerente em graus variáveis, de acordo com a menor ou maior gravidade de cada caso. Em outra parte (4), já tivemos a oportunidade de postular os conceitos de "filtro" ou "prisma" caracterológico e de "morbus" primário e secundário como elementos constituintes axiais da gênese daquilo que denominamos estados psicóides (4). Naquela ocasião, estabelecemos um modelo teórico provável, e talvez plausível, que seja capaz de explicar a formação de sintomas psicopatológicos atípicos que se distanciam dos referenciais fenomenológicos clássicos usualmente encontrados. Recapitulando resumidamente o que foi estabelecido, postulamos que uma desordem afetiva bipolar, por exemplo, correspondendo ao que denominamos "morbus" primário, ao incidir sobre o "filtro" ou "prisma" caracterológico, poderia acionar uma sequência de alterações fisiopatológicas secundárias, o "morbus" secundário, produzindo, desse modo, a morfologia final da fachada clínico-fenomenológica detectada(4). Desse modo, no caso de V., possivelmente, um transtorno afetivo bipolar, o "morbus" primário, poderia deflagrar e amplificar traços esquizóides e esquizotípicos pré-existentes em sua estrutura caracterológica, ou seja, em sua personalidade, produzindo sintomas e vivências anômalas marcadas por um conteúdo marcadamente esquizomorfo. Assim, a sua cólera intensa, súbita e aparentemente imotivada era provocada por lembranças dolorosas do passado e que, agora, presentificavam-se de modo nitidamente reificado e persistente sob o domínio da vivência depressiva. Quanto a isso, sabemos que o pensamento do enfermo melancólico em geral gravita monotonamente em torno de temas tais como morte, ruína e culpa mas, em V. essa perseveração angustiosa era embebida de marcante discordância e inadequação, dotando seu comportamento de um caráter de bizarra imprevisibilidade e incompreensibilidade (6). Daí advinha a impressão de que seu sofrimento íntimo não se encaixava harmonicamente no encadeamento sintônico de sua existência, despertando no observador sentimentos de estar diante de algo despropositado e incoerente. As mesmas explicações são válidas para a paciente W., com ênfase para o gritante aspecto clínico-fenomenológico de regressão ontogenética daquela paciente, chegando ao ponto de manifestar atitudes e sentimentos literalmente idênticos aos de um determinado período de seu desenvolvimento infantil. Ao ser indagada sobre o quê vivenciara em sua primeira crise, durante aqual exibira comportamento flagrantemente infantilizado e pueril, W. respondeu que não se lembrava bem de suas atitudes e do que acontecera na ocasião, exceto do fato de que imagens e cenas de sua infância, particularmente aquelas nas quais seu pai estava presente, passaram a invadir sua consciência de forma maciça e ininterrupta. Segundo ela, essas lembranças referiam-se a fatos desagradáveis do passado que lhe ocasionavam profundos sentimentos de falta, abandono e rejeição, emergindo de modo tão vívido e atual que assemelhavam-se, em nossa opinião, a uma espécie de ecmnésia (7,13). Por outro lado, durante a crise, W. era presa de sentimentos de medo e de terror, cria que as pessoas poderiam fazer-lhe algum mal, bater-lhe, machucá-la, sentia um mal estar indefinível e, frequentemente, era tomada pela convicção súbita de que iria morrer e que não haveria maneira de escapar. Assim, parece-nos que a estrutura fenomenológica dessa vivências anômalas assemelhava-se mais a esboços agudos de cognições ou idéias de ruína embebidas de um sentimento de iminência de consumação de um evento trágico (14), próprio dos quadros melancólicos, do que a ocorrências ou percepções delirantes (9) difusas e incaracterísticas, apesar do transfundo auto-referencial do quadro clínico. Desse modo, é razoável supor que tais eventos psicopatológicos tenham induzido o aspecto da apresentação clínica inusitada da paciente, fazendo-nos pensar que ela passou a viver realisticamente os seus medos e fantasias infantis em uma dimensão simbólica reificadamente concreta. Para complementar a discussão do caso de W. , parece correto pensar-se que a morfologia clínica final de suas crises agudas tenha sido o resultado, como já dissemos, de um transtorno de humor de base mais precisamente, a instalação de um quadro misto com vivências entrelaçadas de sintomas depressivos e hipertímicos - intermediado por sua estrutura caracterológica. Dito de outro modo, a desordem afetiva mista, o verdadeiro "morbus" primário, ao incidir sobre o "filtro" ou "prisma" caracterológico dotado de proeminentes traços histriônicos, acionaria uma sequência de alterações fisiopatológicas secundárias, o "morbus" secundário, produzindo, desse modo, a morfologia clínica final, isto é, sintomas afetivos mesclados com vivências e atitudes histriônicas bizarras e inadequadas, à semelhança de uma verdadeira "psicose histérica". Dessa maneira, o componente histriônico da personalidade modificar-se-ia em algo muito além do que simplesmente características exageradas ou amplificadas pela desordem primária, transformar-se-ia, sim, em um modo de ser psicóide (4), ou seja, em um quadro clínico semelhante, em muitos pontos, às psicoses endógenas, mas denotando sintomas e vivências psicopatológicas fenomenologicamente frustros e abortados. Para terminar a análise do caso, podemos dizer que a puerilização psicóide de W. foi fruto da da presentificação formal de um passado biográfico, caracteristicamente melancólica, mas cujo conteúdo colocou à mostra toda uma sequência de vivências infantis que havia sido simbolicamente complexificada e cristalizada de acordo com as tendências histriônicas constitucionais pré-estabelecidas (14). A esse respeito, pensamos que os traços anômalos de personalidade podem eleger e favorecer alguns tipos específicos de complexificação simbólica, exercendo o papel de eixo norteador e indutor de intensa polarização de determinadas vivências subjetivas, sejam elas reis ou imaginárias (14). Pois bem, finda a discussão teórica dos dois casos clínicos anteriores por nós denominados estados psicóides, faz-se necessário recapitular sumariamente alguns atributos dessas entidades nosológicas que já estabelecemos em outra oportunidade (4). Naquela ocasião, postulamos um padrão fenomenológico de atipicidade psicótica (4) que, ao nosso ver, pode caracterizar aqueles quadros atípicos e que, resumidamente, consiste no seguinte: uma frequente associação entre sintomatologia psicóide e a presença, na personalidade pré-mórbida, de traços importantes ou, mesmo, de um transtorno completo da personalidade, além da concepção de que as vivências anômalas desses quadros correspondem, fenomenologicamente, a sintomas frustros ou abortados das psicoses endógenas clássicas (4). Consequentemente, objetivando uma visão dimensional e espectral dos transtornos psicóticos endógenos, poderemos considerar o padrão fenomenológico de atipicidade psicótica anteriormente descrito como o conceito que corresponde ao pólo de atipicidade psicótica máxima. Visualizemos, portanto, duas ordenadas axiais, sendo que sob cada uma delas colocaremos os dois títulos conceituais respectivos: pólo A que corresponde ao grau máximo de tipicidade psicótica e pólo B que equivale ao grau máximo de atipicidade psicótica. Recapitulando, no pólo A estão agrupados todos os critérios diagnósticos para a caracterização psicopatológica de uma psicose esquizofrênica, inclusive a sua evolução clínica sabidamente desfavorável, e no pólo B se localizam aqueles quadros psicóticos atípicos, os estados psicóides, que acometem esporadicamente pacientes com certos distúrbios da personalidade e apresentam decurso clínico relativamente benigno e favorável. Pois bem, as duas ordenadas axiais que configuram as duas extremidades psicopatologicamente contrastantes do espectro psicótico já estão delineadas como marcos bem nítidos e diametralmente opostos. Então, como preencher o espaço correspondente ao espectro de tipicidade psicótica intermediária? Quais serão os critérios gerais clínico-fenomenológicos evolutivos necessariamente claros e convincentes para isso? À primeira vista, sobressai-se no pólo A um padrão clínico e evolutivo rígido, ao contrário do pólo B onde predomina um padrão clinicamente multiforme e atípico, revestido de uma singular plasticidade. Rigidez e plasticidade, em nossa opinião, são dois termos que deverão corresponder a padrões neurobiológicos bem definidos, principalmente no campo de estudo psicobiológico da filogênese da linguagem (representação) Ù emoção. Essa correspondência, certamente, interessará à pesquisa dos mecanismos etiopatogênicos e de expressão psicopatológica daquilo que hoje denominamos quadros psicóticos. Sem dúvida, as pesquisas atuais, enfocando as mediações bioquímicas que se intricam complexamente nos diversos sistemas neurotransmissores e as investigações que têm comprovado disfunções cerebrais locais como causas dos sintomas psicóticos, confluirão, forçosamente, para a postulação definitiva de padrões básicos, filogeneticamente arcaicos(15), de estruturas neurobiológicas rígidas e relativamente simples até aquelas dotadas de imensa plasticidade e flexibilidade, inclusive no que se refere à expressão psicopatológica dos quadros psicóticos atípicos. Com efeito, podemos notar que, partindo de uma expressão sintomatologicamente padronizada e uniforme, como é o caso das formas clássicas de psicose esquizofrênica com sua conhecida constelação psicopatológica e evolução clínica muito típicas situadas no pólo A, caminhamos progressivamente dentro de um espectro cada vez mais rarefeito em termos de tipicidade até atingirmos a visualização daqueles quadros psicóticos onde predominam características psicopatológicas individuais ou ontogenéticas no pólo B, destacando-se, definitivamente, do padrão rígido filogenético e adquirindo características peculiares comple tamente distintas das primeiras. Assim, poderemos vislumbrar nessa trajetória rumo ao pólo máximo de atipicidade psicótica, vivências subjetivas incaracterísticas, estranhas e incompletas no que tange à classificação do material psicopatológico, visualizando-se sintomas psicóticos típicos de alguma forma desmembrados, como que malogrados e frustros, naqueles estados psicóides em pacientes com distúrbios da personalidade. Dessa maneira, já conseguimos eleger alguns critérios teóricos para o preenchimento do espectro intermediário de tipicidade psicótica, quais sejam, a morfologia psicopatológica, a evolução clínica e a rigidez filogenética subjacentes às formas clínicas típicas em oposição à plasticidade ontogenética das formas atípicas. Esta plasticidade ontogenética, por sua vez, subentende uma importância cada vez maior das circunstâncias desfavoráveis do meio ambiente, ou seja, dos fatores psicossociais para o desencadeamento dos quadros psicóides mais atípicos. Em outras palavras, esse modelo teórico sugere que quanto mais atípico for o padrão fenomenológico de determinado quadro psicótico, mais facilmente ele será deflagrado por fatores psicossociais. É notória a semelhança clínica dos transtornos delirantes com os quadros esquizofrêni cos(16,17,18,19,20), o que se dá às custas da existência, em ambos, de juízos delirantes (21,22). A diferenciação é que, no caso da paranóia, há a ausência relativa de fenômenos tais como alucinações (5) e de vivências anômalas de influência, ao lado da preservação integral da inteireza da personalidade dos enfermos. Além disso, os temas delirantes, em geral de prejuízo, ciúmes e erótico-amorosos, relacionam-se estreitamente a aspectos ambientais e circunstanciais perfeitamente cabíveis no universo cultural e existencial do indivíduo, isto é, são consoantes com o seu tempo, sua vida, seus hábitos e sua visão de mundo. Ao contrário, na esquizofrenia são comuns temas delirantes completamente desvinculados do patrimônio inteligível do senso-comum, dotados que são de um caráter mágico-anímico atemporal e arquetípico(22). Enquanto na paranóia proliferam juízos delirantes embebidos de inteligibilidade temporal e biográfico-cultural, na esquizofrenia vicejam também juízos anômalos, porém imersos em uma atmosfera bem mais arcaica e longínqua, repleta de elementos cósmicos e ctônicos. A primeira remete ao mágico-anímico biográfico-individual e a segunda ao animismo coletivo (22). Aquela assemelha-se à concretização reificada de um mito individual bem engendrado e concatenado, enquanto a última representa um mergulho abissal e caótico na universalidade do mito coletivo (22). Uma carrega um conteúdo reificado predominantemente ontogenético e a outra uma representação reificada exclusivamente filogenética. Dessa maneira, nada mais razoável do que situar os transtornos delirantes imediatamente a seguir ao grupo das esquizofrenias no espectro intermediário de tipicidade psicótica. Logo depois vêm aqueles quadros psicóticos denominados esquizoafetivos, devido ao fato de que neles, em geral, há uma evolução clínica desfavorável, sem dúvida, resultante do processo de desdiferenciação simbólico-afetiva (8) que ocorre mais ou menos simultaneamente ao transtorno de humor. Seguem-se as formas clínicas delirantes da doença afetiva, seja a mania ou a depressão delirantes que, apesar de seu aspecto agudo e produtivo, não induzem um comprometimento ou déficit definitivo e irreversível da dimensão simbólico-afetiva, mesmo nos casos onde as fases se sucedem rapidamente. Trata-se de quadros psicóticos que são geralmente bem compensados com a terapêutica com o carbonato de lítio, valproato ou carbamazepina, isoladamente ou em associação entre si. Vêm, após, os transtornos esquizofreniformes, de eclosão aguda e prognóstico favorável, muitas vezes bem compensados com o uso de lítio ou demais estabilizadores do humor seguindo-se, sucessivamente, os transtornos psicóticos breves e os estados psicóides em pacientes com transtornos da personalidade, também de evolução clínica relativamente benigna. Para facilitar o entendimento, acredito que o diagrama esquemático que vem a seguir pode resumir, didaticamente, tudo o que foi discutido até agora.
E = Esquizofrenias A = Pólo máximo de tipicidade psicótica TD = Transtornos Delirantes B = Pólo máximo de atipicidade psicótica TE-A = Transtorno Esquizoafetivo TAD = Transtornos Afetivos delirantes TE = Transtorno Esquizofreniforme TPB = Transtorno Psicótico Breve A B= Espectro psicótico intermediário Note-se que depois dos Transtornos Delirantes (TD), inicia-se, a partir dos quadros esquizoafetivos (E - A), um amplo espectro de formas clínicas psicóticas passíveis ao tratamento e controle pelo lítio e outros estabilizadores do humor. Parece que esses quadros consistem em um verdadeiro "espectro das psicoses do lítio", culminando em estados psicóides bastante complexos e atípicos onde, muitas vezes, o controle terapêutico só é efetivo quando associamos lítio, valproato ou neurolépticos em baixas doses com anti-depressivos. Finalizando esta exposição, é bom dizer que o modelo teórico que foi aqui discutido - representado pelo diagrama anterior - apesar de se assemelhar a um continuum, não tem maiores pretensões senão a de se mostrar útil na prática clínica cotidiana, auxiliando o médico a diagnosticar corretamente e instituir o tratamento adequado para os seus pacientes. Creio que nunca serão excessivas as contribuições que possam auxiliar o exercício diagnóstico nessa atividade clínica que, sem dúvida, se constitui como aquela mais complexa e difícil dentre todas as especialidades da medicina, ou seja, a prática da Psiquiatria.
Summary: A dimensional interpretation of psychotic disorder: from typicality to atypicality In this paper, by presenting two clinical cases, the author frames the concepts of psychotic typicality and atypicality and then compares atypical psychotic cases with the more typical ones, particularly those of schizophrenia. From this comparison, he develops a theoretical model wich culminates in a diagrammatic representation of several nosologic unities belonging to the endogenous psychoses scope, placing them within a specific spectrum according to their degree of typicality, greater or smaller. The author believes these theoretical considerations can enhance the psychiatric semiologic tools wich would enable physicians to face the diagnosis and treatment of atypical psychosis more confidently and accurately.
Key Words: Psychotic typicality and atypicality, Psichoid states, Psychotic spectrum, Symbolic-affective dis-differentiation, Reification, Characterological "prism", Psychopathology, Phenomenology.
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