RESENHA SOBRE A OBRA
"Consiliência - A Unidade do Conhecimento"

"Consiliência - A Unidade do Conhecimento" ("Consilience - The Unity of Knowledge") ; Edward O. Wilson ; Ed. Alfred A. Knop, 332 págs., US$24 ; Pode ser adquirido pela Internet através da Amazon Books(http://www.amazon.com)

"A cultura é criada pela coletividade de mentes e cada mente, por sua vez, é o produto do cérebro humano geneticamente estruturado. Genes e cultura são, como conseqüência, indissociavelmente ligados. Porém, essa ligação é flexível em um grau ainda desconhecido......Os genes determinam leis epigenéticas que correspon dem a vias neurais e padrões regulares de desenvolvimento cognitivo para a integração própria de cada mente . A mente cresce, do nascimento à morte, absorvendo partes da cultura existente e disponível, com seleções dirigidas através das regras epigenéticas herdadas pelo cérebro individual."
O trecho acima reproduzido foi retirado do Capítulo VII ("Dos Genes à Cultura") do livro "Consiliência - A Unidade do Conhecimento" de E. O. Wilson que foi lançado em março deste ano nos Estados Unidos. Sem dúvida, o autor parece fazer jus ao coro de elogios que vem despertando no meio acadêmico norte-americano mais pelo teor paradigmático e surpreendente de suas afirmações do que pelo seu estilo leve, agradável e envolvente, sempre convidando o leitor a acompanhá-lo no vôo imaginativo de sua poderosa aventura intelectual. Com efeito, Edward Osborne Wilson, nascido no Alabama em 1929, é um respeitado biólogo e um cientista bastante premiado, tratando-se de um intelectual solidamente estabelecido no território acadêmico americano. É autor de obras como "A Natureza Humana" e "As Formigas"(com elas recebeu dois prêmios "Pulitzer"), além de ter sido homenageado com outras medalhas e honrarias no Japão, Suécia e Estados Unidos pelas suas importantes contribuições científicas relativas à biologia, ecologia e meio ambiente. Ao longo do tempo, cunhou termos já consagrados, como "biofilia", "sociobiologia" e "biodiversidade" e agora parte, em seu novo livro, para um projeto mais ambicioso e abrangente. No Capítulo I, intitulado "O Encantamento Jônico", Wilson já começa a delinear, com clareza, as linhas mestras de sua gigantesca empresa, ou seja, promover a unificação do saber de campos do conhecimento tradicionalmente mantidos incomunicáveis, no caso, ciências naturais e humanas, incluindo ética, arte e religião. Afirma que tal propósito já estava presente no ideal grego da escola jônica pré-socrática, representado no livro por Tales de Mileto, o fundador das ciências físicas. Mais, diz que a busca da unificação do conhecimento encontrou seu ápice no trabalho dos filósofos enciclopedistas franceses do século XVIII, sofrendo, entretanto, após esse momento histórico, uma decisiva fragmentação dos inúmeros campos de saber que perdura até os dias de hoje. Esse estilhaçamento do saber fez com que, se de um lado, as ciências naturais tivessem um desenvolvimento vertiginoso, de outro, as ciências humanas continuaram mergulhadas no caos, às custas, principalmente, das concepções do movimento pós-modernista. Quanto a esse movimento, que considera nocivo, diz que os textos atuais de humanidades são verdadeiros "escândalos de banalidades", colocando a psicanálise lacaniana ao lado de outros modismos pós- modernistas, como afrocentrismo, ecofeminismo e neo-marxismo, dentre outros, e qualificando o filósofo Derrida como dotado de uma "prosa obscurantista ornamentada" e duvidando que, ele mesmo, compreendesse o que aquilo significava (Cap. II). Desse modo, segundo ele, urge resgatar o ideal iluminista através da biologia e suas explicações de teor darwinista, que considera o único instrumento capaz , à maneira de uma "Pedra de Rosetta", de elucidar o monolito até agora incomunicável das ciências humanas, da mesma maneira que a genética e a biologia celular se fundamentam e se clarificam através da biologia molecular. Em sua opinião, só dessa maneira, a humanidade terá condições de compreender e solucionar certos problemas graves que tanto a afligem, tais como violência, intolerância racial, superpopulação, desequilíbrio ecológico e ambiental,etc. No mais, aborda certos temas controvertidos como, por exemplo, incesto, altruísmo e territorialismo, de uma forma bastante instigante, distanciando-se completamente daquelas explicações dogmáticas costumeiras, tautológicas e tediosas.
Em suma, trata-se de um livro que, mais que um entretenimento agradável e reconfortante para a inteligência do leitor, representa uma tentativa bastante engenhosa e convincente para responder questões importantíssimas da natureza humana, hoje ainda obscuras, com repercussões diretas no próprio futuro da humanidade. A viabilidade do ser humano é, assim, interrogada, podendo, nosso futuro, ser predominantemente luminoso ou tragicamente sombrio. A escolha é de cada um de nós.


GUSTAVO FERNANDO JULIÃO DE SOUZA